domingo, 7 de dezembro de 2025

RESUMO. INFORMATIVO 872 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 872 DO STJ. JULGADOS SELECIONADOS PELO PROFESSOR FLAVIO TARTUCE


CORTE ESPECIAL


Processo


EREsp 1.304.939-RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, por maioria, julgado em 20/8/2025, DJEN 30/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Ação civil pública. Honorários advocatícios. Associação civil autora. Divergência entre turmas do STJ. Art. 18 da Lei n. 7.347/1985. Princípio do acesso à justiça. Distinção entre legitimados. Simetria inaplicável ao réu.


Destaque


Cabe condenação da parte ré em honorários advocatícios quando a ação civil pública for ajuizada por associação ou fundação privada.


Informações do Inteiro Teor


A questão em discussão consiste em decidir se o réu vencido em ação civil pública ajuizada por associação civil é isento do pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.


A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça já fixou o entendimento no sentido da impossibilidade de condenação da parte ré em ação civil pública em honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé, à luz do princípio da simetria, em consonância com o art. 18 da Lei n. 7.347/1985.


Observa-se, contudo, que em julgamentos da Corte Especial, a questão ficou adstrita à aplicação do princípio da simetria à parte demandada na ação civil pública quando ajuizada pelo Ministério Público ou pela União. Não se discutiu a matéria sob a perspectiva de ser a parte autora da ação civil pública associação civil.


Em outras palavras, o raciocínio jurídico desenvolvido para subsidiar a tese arrimada no princípio da simetria levou em consideração apenas as hipóteses nas quais a ação civil pública é ajuizada pelo Ministério Público ou por ente público. Assim, a matéria não se encontra pacificada.


Ademais, as Segunda e Terceira Turmas, em julgamentos recentes, têm adotado uma ressalva ao entendimento sufragado pela Corte Especial, justamente quando se tratar de associações ou fundações privadas no polo ativo da ação civil pública, sobrelevando a necessidade de se garantir maior acessibilidade a Justiça para a sociedade civil organizada, bem como a impropriedade de se pretender equiparar organizações não governamentais a grandes grupos econômicos/instituições do Estado.


Assim, deve ser reafirmada a jurisprudência da Corte Especial, no sentido de que, quando a ação civil pública é ajuizada pelo Ministério Público ou por ente público, pelo princípio da simetria, é descabida a condenação da parte ré em honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé, consoante o art. 18 da Lei n. 7.347/1985.


Não obstante, esse entendimento não se aplica quando a parte autora da ação civil pública é associação ou fundação privada, diante da necessidade de se garantir maior acessibilidade à Justiça para a sociedade civil organizada, bem como da impropriedade de se equiparar organizações não governamentais a grandes grupos econômicos/instituições do Estado.


Informações Adicionais


Legislação


Lei n. 7.347/1985, art. 18.


Saiba mais:


· Informativo de Jurisprudência n. 738


· Informativo de Jurisprudência n. 730


· Legislação Aplicada / Lei 7.347/1985 (Ação Civil Pública) - Ação Civil Pública


· Informativo de Jurisprudência n. 558


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Processo


AgInt no EAREsp 1.742.202-SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, por maioria, julgado em 5/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Inexistência de representação processual quando da interposição dos embargos de divergência. Instância especial. Não correção da irregularidade mesmo após intimação para este fim. Outorga de poderes pela parte ao subscritor dos embargos de divergência em data posterior ao da sua interposição. Não conhecimento do recurso.


Destaque


A representação processual em Tribunal Superior deve ser comprovada mediante instrumento de mandato constituído em data anterior ao da interposição do respectivo recurso, salvo comprovação de situações urgentes para evitar preclusão, decadência ou prescrição, ou para praticar ato considerado urgente, sob pena de não ser conhecido.


Informações do Inteiro Teor


Com base no art. 37 do CPC de 1973, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 115/STJ, segundo a qual: Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos. (Corte Especial, em 27/10/1994, publicada no DJ de 7/11/1994).


O conteúdo do art. 37 do CPC/73 foi replicado pelo art. 104 do CPC de 2015, não havendo que se falar, portanto, em superação do referido enunciado sumular.


Ademais, nos termos dos arts. 76 e 932 do CPC de 2015, a consequência do não saneamento do vício de representação processual enseja o "não conhecimento"/"inadmissibilidade" do recurso, o que se coaduna com a "inexistência" propugnada na Súmula n. 115/STJ.


Considerando a adequação da citada súmula mesmo após a vigência do CPC de 2015, o STJ pacificou o entendimento de que, para suprir vício de representação processual nesta instância especial, não basta a juntada de procuração ou substabelecimento, revelando-se necessário que a outorga de poderes tenha sido conferida em data anterior à da interposição do respectivo recurso.


Dessa forma, tanto sob a égide do CPC de 1973 quanto do atual código, é de rigor que o advogado (regularmente inscrito na OAB) tenha procuração com outorga de poderes pela parte a fim de exercer a sua regular representação em juízo.


Apenas excepcionalmente é permitido ao advogado postular em juízo sem o correspondente instrumento de mandato, devendo a situação ser devidamente justificada nos autos nas hipóteses expressamente indicadas na lei processual civil para evitar perecimento de direitos (preclusão, decadência ou prescrição, ou para praticar ato considerado urgente). Em outras palavras, nestas hipóteses, o advogado deve claramente explicar nos autos porque praticou o ato sem a contemporânea procuração, indicando a ocorrência excepcional de situação de preclusão, decadência ou prescrição, ou para a prática de ato considerado urgente.


No caso, verifica-se que os poderes conferidos ao signatário dos embargos de divergência no substabelecimento juntado aos autos somente foram outorgados em data posterior ao da interposição do recurso, sem que houvesse a respectiva justificativa para tanto.


Assim, não se deve conhecer do respectivo recurso, sobretudo porque este comportamento processual nesta instância especial encontra-se em dissonância ao previsto na legislação processual civil e na consolidada jurisprudência desta Corte.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC/1973), art. 37;


Código de Processo Civil (CPC/2015), arts. 76, 104 e 932.


Súmulas


Súmula n. 115/STJ


SEGUNDA SEÇÃO


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Processo


Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 18/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


Tema


Ação de modificação de guarda. Indícios de violência doméstica e familiar. Competência da comarca em que a criança exerce, com regularidade, seu direito à convivência familiar. Princípios do melhor interesse e do juízo imediato.


Destaque


Com fundamento nos princípios da proteção integral e do juízo imediato, é do melhor interesse da criança o processamento da ação que busca modificar sua guarda o foro em que exerce, com regularidade, seu direito à convivência familiar e comunitária, especialmente diante de indícios de violência doméstica e familiar perpetrados contra sua genitora e, possivelmente, contra si.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em decidir qual o Juízo competente para o processamento de ação de guarda na hipótese de conflito entre o juízo que definiu a guarda e o do local em que a criança atualmente reside.


A ação que decreta a guarda de criança e adolescente faz coisa julgada in rebus sic stantibus, podendo ser modificada sempre que alterada a situação fática originária.


De acordo com a Súmula 383 do STJ: "A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicílio do detentor de sua guarda".


As particularidades da situação em análise autorizam a mitigação da norma prevista no referido enunciado, sempre em atenção ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.


Com fundamento na conjugação dos princípios da proteção integral e do juízo imediato, orientadores dos critérios do art. 147 do ECA, é mais adequada a declaração de competência do juízo do local onde se encontra atualmente a criança ou o adolescente.


O entendimento exarado pelo STF no julgamento das ADIs n. 4.245 e n. 7.686, em 4/9/2025, pode também ser utilizado em situações de disputa de guarda e retorno da convivência de criança e adolescente em hipótese de indícios de violência doméstica perpetrada no território brasileiro. Logo, diante de conflito de competência em razão de disputa de guarda de criança em que o contexto fático diz respeito a modificação de domicílio da genitora com os filhos em razão de indícios de violência doméstica, prudente que o juízo do domicílio em que a criança se encontra atualmente julgue a demanda.


No conflito em análise, considerando-se (I) o local do atual domicílio do menino; (II) os indícios de violência doméstica perpetrados pelo genitor à genitora e ao filho, que levaram com que saíssem da Noruega para buscar abrigo no Brasil e, após a vinda do genitor ao país, mudassem para a cidade de Araçatuba-SP; (III) a ausência de comprovação de que a genitora tenha se valido de "fraude processual" ao mudar de domicílio, como forma de esquivar-se do provimento judicial exarado pelo Juízo da Comarca de Natal-RN; (IV) o fato de que o próprio Juízo de Natal-RN manifestou-se por sua incompetência, corroborado pelo parecer do MPF; é do Juízo do atual domicílio da criança a competência para processar e julgar ação de modificação de guarda.


Informações Adicionais


Legislação


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), art. 147


Súmulas


Súmula n. 383/STJ


Precedentes Qualificados


ADI n. 4.245


ADI n. 7.686


TERCEIRA TURMA


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Processo


REsp 2.166.788-RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Execução de título extrajudicial. Prescrição intercorrente. Lei n. 14.195/2021. Diligências do credor ou penhora de valor irrisório. Irrelevância. Prazo que se inicia automaticamente.


Destaque


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A partir da entrada em vigor da Lei n. 14.195/2021, a promoção de diligências infrutíferas não interrompem a prescrição intercorrente, que passa a correr automaticamente, independentemente de inércia do credor.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia consiste em decidir se a penhora de valor irrisório, ocorrida antes da Lei n. 14.195/2021, interrompe a prescrição intercorrente.


Embora não contasse com previsão expressa no CPC/1973, a jurisprudência do STJ já admitia a figura da prescrição intercorrente, que estava intimamente vinculada à inércia da parte. Inovando em relação à ordem jurídica anterior, o CPC/2015 passou a disciplinar o instituto, estatuindo o seu regime jurídico próprio, sobretudo, nos arts. 921 a 923.


Perante a versão original do CPC/2015, não havia dispositivo que previsse expressamente causas de interrupção da prescrição intercorrente. A previsão era apenas de que "os autos serão desarquivados para prosseguimento da execução se a qualquer tempo forem encontrados bens penhoráveis" (art. 921, § 3º, CPC).


Assim, "a partir da entrada em vigor da Lei n. 14.195/2021, ao contrário do que se verificava na redação original do código, não há mais necessidade de desídia do credor para a consumação da prescrição intercorrente, cujo prazo iniciará automaticamente" (REsp 2.090.768/PR, Terceira Turma, DJe 14/11/2024).


Com isso, as Turmas de Direito Privado do STJ fixaram o entendimento de que "a promoção de diligências infrutíferas não tem o condão de suspender ou interromper o prazo prescricional, tornando a dívida imprescritível" (AgInt no REsp 1.986.517/PR, Quarta Turma, DJe 9/9/2022).


Observando-se a disciplina de direito intertemporal, nos termos do art. 14 do CPC, a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.


Com efeito, a nova sistemática, segundo a qual a inércia do credor deixa de ser o critério para decretar a prescrição intercorrente, somente pode reger os atos realizados a partir de 27/08/2021, data da entrada em vigor da Lei n. 14.195/2021 (REsp n. 2.090.768/PR, Terceira Turma, DJe 14/11/2024).


Dessa forma, considerando que, no caso analisado, à época da constrição de bens, não estava vigente a Lei n. 14.195/2021, as diligências do credor eram suficientes para afastar a prescrição intercorrente. Por isso, quanto ao valor da quantia bloqueada, é irrelevante aferir a sua suficiência.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 921 a 923


QUARTA TURMA


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Processo


REsp 2.236.487-SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 18/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO ELEITORAL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Obrigação partidária. Ação de cobrança. Ausência de responsabilidade solidária entre esferas partidárias distintas. Emenda à inicial. Impossibilidade após sentença de mérito.


Destaque


1. A responsabilidade por obrigações partidárias é exclusiva do órgão que deu causa ao descumprimento, não havendo solidariedade entre os diretórios de diferentes esferas.


2. A alteração do polo passivo não é admitida após a prolação de sentença de mérito, pois estabilizada a demanda e encerrada a atividade jurisdicional de primeiro grau.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em verificar se há legitimidade passiva de diretório estadual de partido político para ação de cobrança ajuizada por empresa do setor gráfico, visando ao pagamento de dívida decorrente de contrato de prestação de serviços e fornecimento de material gráfico a diretório municipal.


Apesar de os partidos políticos responderem solidariamente pelas dívidas contraídas pelos candidatos para a realização da campanha eleitoral, na forma do art. 17 da Lei n. 9.504/1997, esta solidariedade recai apenas sobre o órgão partidário vinculado ao candidato, na respectiva esfera de atuação (nacional, estadual ou municipal), afastando-se a possibilidade de condenação dos órgãos partidários alheios à candidatura, nos termos do art. 15-A da Lei n. 9.096/1995, com redação dada pela Lei n. 12.034/2009, cujo teor já foi declarado constitucional pelo STF (STF. Plenário. ADC 31/DF, Rel. Ministro Dias Toffoli, julgado em 22/9/2021 - info 1031).


Dessa forma, tendo o Tribunal de origem fixado a premissa fática segundo a qual a contratação foi realizada com o diretório municipal, verifica-se a ilegitimidade passiva do diretório estadual.


Sobre a estabilização subjetiva da lide após a citação, a reforma processual estabelecida pelo CPC/2015 procurou atualizar o instituto ao simplificá-lo e substituí-lo pelos arts. 338 e 339 do CPC, integrando-o ao modelo cooperativo do processo. Deslocou-se o enfoque do formalismo estrito para a realização efetiva da tutela jurisdicional. Deixou-se de exigir, como requisito para substituição da parte requerida, o erro justificável do autor, sendo irrelevante a razão do equívoco.


A jurisprudência do STJ evoluiu para admitir a alteração do polo passivo mesmo após o saneamento do processo, porém tal providência encontra limite intransponível na sentença de mérito, que cumpre função estabilizadora e encerra a atividade jurisdicional de primeiro grau, fazendo operar a preclusão quanto à modificação dos elementos subjetivos da demanda.


No caso, afirmou-se não ser o diretório estadual devedor porque ausente o vínculo obrigacional invocado. Trata-se, portanto, de julgamento de improcedência do pedido, com resolução do mérito (art. 487, I, CPC), pois o elemento determinante para se definir a natureza da decisão é o seu conteúdo. Não se trata de sentença terminativa de extinção por vício subjetivo, mas sim de pronunciamento de mérito, em segunda instância, desfavorável à autora, estando atendido, pois, o princípio da primazia do julgamento de mérito.


Inviável, portanto, reabrir a fase cognitiva para substituição do réu, pois não se pode transformar a fase recursal em segunda chance postulatória para remendar o polo passivo.


Informações Adicionais


Legislação


Lei n. 9.096/1995, art. 15-A


Lei n. 9.504/1997, art. 17


Código de Processo Civil (CPC), art. 338; art. 339; e art. 487, I


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Processo


REsp 2.163.244-SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. para acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por maioria, julgado em 18/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Cumprimento de sentença. Pesquisa de bens. Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos - SNIPER. Sigilo bancário resguardado. Legalidade.


Destaque


É legal a utilização do Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos no âmbito cível, por não importar em necessária quebra do sigilo bancário do pesquisado, devendo o magistrado avaliar (i) a necessidade de consulta à luz das circunstâncias do caso concreto, tendo em vista eventuais medidas executivas já implementadas, com a especificação dos sistemas deflagrados e informações requeridas; e (ii) a exigência de classificar como sigilosas parte ou a integralidade das informações fornecidas pelo SNIPER.


Informações do Inteiro Teor


A questão em análise é relativa à possibilidade de se pleitear a busca por meio do sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (SNIPER) nas execuções cíveis e à necessidade de deliberação judicial determinando a quebra de sigilo bancário.


Tal sistema é uma solução tecnológica que agiliza e facilita a investigação patrimonial para magistrados e servidores de todos os tribunais brasileiros integrados à Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br). Com esse sistema é possível realizar a identificação, o bloqueio e a constrição dos ativos de forma centralizada, em uma única ferramenta.


O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) explica que o sistema possibilita o cruzamento de dados de diferentes bases (abertas e sigilosas). O Conselho informa que apenas magistrados e servidores do Poder Judiciário mediante login com credenciais oficiais na PDPJ-Br e no Jus.br terão acesso ao sistema SNIPER.


No caso, a Corte local entendeu pela possibilidade de pesquisa pelo SNIPER somente em casos que justifiquem a quebra do sigilo bancário, quais sejam, aqueles em que há fundada suspeita de prática de ilícito, a ferramenta não poderia ser utilizada para a cobrança de dívidas cíveis.


Com efeito, o SNIPER é uma solução tecnológica que apenas otimiza a utilização de ferramentas já em uso há anos nas execuções cíveis, com respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em virtude da necessidade de se garantir a efetividade do processo executivo, o que inclui o uso das novas tecnologias disponíveis.


Logo, diante do embasamento legal e jurisprudencial das medidas executivas congregadas pelo SNIPER, reconhece-se que, existindo ordem judicial de consulta e constrição devidamente fundamentada, com a especificação dos sistemas deflagrados e indicação de eventuais requisitos de validade próprios de cada ferramenta, não há que se falar de plano em ilegalidade ou ofensa aos direitos do devedor.


Contudo, no caso concreto, pode haver meios menos gravosos ao executado na busca pela satisfação do crédito, razão pela qual o deferimento da pesquisa via SNIPER nas execuções cíveis deve ocorrer de forma fundamentada, em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.


Em geral, é plenamente possível a utilização do sistema para pesquisa e determinação de medidas constritivas sem que sejam requisitados e, portanto, publicizados os dados relativos às movimentações bancárias da parte executada. A questão reside em quais sistemas serão acionados via SNIPER e quais informações serão requeridas pelo magistrado ao determinar a pesquisa.


De todo modo, cabe aos magistrados e servidores adotarem as medidas necessárias para assegurar a confidencialidade de eventuais informações do executado que estejam protegidas pelo sigilo bancário, bem como pela Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD, decretando, se necessário, o sigilo total ou parcial do processo ou de determinados documentos e peças processuais.


Nesse sentido, mesmo em hipóteses em que, em tese, haveria a possibilidade da quebra do sigilo bancário, o Judiciário tem condições de evitá-lo, determinando e fazendo observar o sigilo das informações, protegendo-as da publicidade ao determinar que sejam albergadas pelo segredo de justiça.


Não há, portanto, que se falar, como regra, em necessidade de decisão judicial determinando a quebra do sigilo bancário do devedor para utilização do sistema SNIPER para a satisfação de dívida civil.

domingo, 23 de novembro de 2025

RESUMO. INFORMATIVO 871 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 871 DO STJ. 

Processo

REsp 2.133.602-RJ, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 12/11/2025 (IAC 20).


Ramo do Direito


DIREITOS HUMANOS, DIREITO DOS GRUPOS VULNERÁVEIS, DIREITO ADMINISTRATIVO MILITAR


Tema


Militares transgêneros das Forças Armadas. Alteração de nome e gênero no registro civil. Retificação dos registros funcionais. Uso do nome social. Direito fundamental à identidade de gênero como expressão da dignidade da pessoa humana. Vedação de reforma compulsória fundada exclusivamente na condição de transgênero. Princípio da legalidade e separação dos poderes. Inexistência de violação. Ausência de incapacidade decorrente da transexualidade. Despatologização (CID-11). Controle de convencionalidade. IAC 20.


Destaque


No âmbito das Forças Armadas: (a) é devido o uso do nome social e a atualização dos assentamentos funcionais e de todas as comunicações e atos administrativos para refletir a identidade de gênero do militar; (b) é vedada a reforma ou qualquer forma de desligamento fundada exclusivamente no fato de o militar transgênero ter ingressado por vaga originalmente destinada ao sexo/gênero oposto; (c) A condição de transgênero ou a transição de gênero não configura, por si só, incapacidade ou doença para fins de serviço militar, sendo vedada a instauração de processo de reforma compulsória ou o licenciamento ex officio fundamentados exclusivamente na identidade de gênero do militar.


Informações do Inteiro Teor


A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, admitiu o recurso como Incidente de Assunção de Competência (IAC), fixando como objeto de deliberação a seguinte tese: "Definir, a partir da alteração do prenome e da classificação de gênero no registro civil de militares transgêneros, os efeitos jurídicos no âmbito das Forças Armadas - em especial o direito à permanência na ativa e à vedação da reforma compulsória fundamentada exclusivamente nessa condição".


É imperativo reconhecer o contexto social no qual a questão jurídica se insere. A população transgênera no Brasil enfrenta um cenário de discriminação estrutural, estigmatização e violência endêmica. Conforme o Dossiê 2025 da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA), em 2024 foram identificados 122 assassinatos de pessoas trans no Brasil. Em dados internacionais compilados pela TGEU/TMM, o Brasil permaneceu, pelo 16º ano consecutivo, como o país que mais assassina pessoas trans no mundo.


Esse contexto estrutural não é alheio ao ambiente castrense. A despeito dos avanços, a própria origem deste IAC demonstra a resistência institucional em reconhecer a identidade de gênero de seus membros, culminando em processos de reforma compulsória. É, pois, à luz desse cenário, e não como uma questão abstrata de direito administrativo militar, que se deve decidir a presente controvérsia, com vista à efetivação de direitos humanos fundamentais e à proteção da dignidade de um grupo historicamente vulnerabilizado.


A identidade de gênero constitui expressão direta da dignidade da pessoa humana, atributo protegido pela Constituição Federal (art. 1º, III, e art. 3º, IV). Portanto, à luz dos princípios da dignidade e da isonomia, os militares transgêneros que retificaram seu prenome e gênero no registro civil fazem jus à correspondente atualização de todos os seus assentamentos funcionais no âmbito das Forças Armadas, passando a constar neles seu gênero autopercebido e o respectivo nome social. Por sua vez, o Decreto Federal n. 8.727/2016, que regulamenta o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero na Administração Pública Federal, confere suporte normativo a tal providência, impondo a todas as autoridades administrativas o dever de adequar cadastros e documentos oficiais segundo a identidade de gênero declarada.


No contexto castrense, não existem critérios ou justificativas válidas que permitam restringir o uso do nome ou do gênero adotado por militares transgêneros; ao revés, impõe-se tratamento igualitário a essas pessoas em comparação com os demais militares do mesmo gênero identitário, eliminando distinções discriminatórias no ambiente funcional.


A interpretação das normas internas deve estar em consonância com os tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é parte (controle de convencionalidade). No tocante aos direitos de pessoas trans, destaca-se a obrigação estatal de harmonizar a atuação administrativa e judicial com os parâmetros fixados pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos e pela jurisprudência da Corte Interamericana. A Opinião Consultiva n. 24/2017 da Corte IDH, ao versar sobre identidade de gênero, nome e direitos das pessoas trans, delineia balizas que vinculam todas as autoridades brasileiras, reforçando a vedação de atos estatais que atentem contra a dignidade, a privacidade e a igualdade das pessoas transgênero. Nesse mesmo sentido, os Princípios de Yogyakarta funcionam como diretriz interpretativa qualificada, enfatizando a necessidade de inclusão e respeito às pessoas LGBTI+ em todas as esferas, inclusive no serviço militar. Desse conjunto normativo-convencional extrai-se uma conclusão: é incompatível com a Convenção Americana (e, portanto, inconvencional e ilegal) qualquer medida governamental que estigmatize, exclua ou limite o militar exclusivamente em razão de sua identidade de gênero.


Assim, é ilegal e inconvencional a reforma compulsória de militares com fundamento exclusivo em sua condição de transgênero. Uma vez reconhecida oficialmente a identidade de gênero do militar, assegura-se seu direito de permanecer no serviço ativo, vedada a transferência compulsória para a inatividade baseada unicamente em incongruência de gênero.


Rechaça-se, portanto, a tese de que a condição de transexualidade acarreta, por definição, inaptidão para as atividades castrenses. A mera identificação do militar como pessoa trans não constitui, por si, causa de incapacidade física ou mental hábil a ensejar sua reforma ex officio. A Lei n. 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), ao elencar as moléstias e condições que podem justificar a reforma por invalidez, não inclui a transexualidade entre os motivos de afastamento, e não há base fática objetiva para equipará-la a qualquer patologia incapacitante. Ademais, a suposição de que todo militar trans necessitaria de tratamento de saúde incompatível com a carreira é infundada e estereotípica.


A classificação internacional de doenças da Organização Mundial da Saúde (CID-11) deixou de categorizar a transexualidade como transtorno mental, passando a considerá-la sob o prisma da saúde sexual, o que consagra a despatologização da identidade transgênero. Esse avanço científico-normativo afasta o antigo paradigma da CID-10 (que rotulava a transexualidade como "transexualismo") e impede que diagnósticos médicos ultrapassados sejam utilizados para justificar a reforma de militares trans.


Pelo exposto, não cabe a invocação da separação dos poderes. Ao vedar reformas e desligamentos discriminatórios e ordenar a adequação de assentamentos e rotinas ao gênero identitário, o Judiciário não legisla: aplica diretamente a Constituição e a CADH diante de práticas administrativas incompatíveis com direitos fundamentais.


Em conclusão, todas as linhas do Recurso Especial (vinculação ao edital/ingresso, legalidade estrita/art. 142, § 3º, X, necessidade de lei específica, separação dos poderes, presunção de incapacidade e alegados constrangimentos logísticos) colidem com: (a) a Constituição tal como interpretada pelo STF (ADI 4.275; Tema n. 761/STF); (b) a OC 24/17 e o controle de convencionalidade; (c) os Princípios de Yogyakarta (igualdade no emprego público, inclusive em forças militares); (d) a incompatibilidade de reformas/desligamentos fundados exclusivamente na identidade trans e a inexistência de ofensa à isonomia.


Destarte, acórdão submetido ao rito do art. 1.036 e seguintes do Código de Processo Civil (CPC/2015), fixando-se, a teor do disposto nos arts. 947, § 3º, do CPC/2015, e 104-A, III, do Regimento Interno do STJ (RISTJ), as seguintes teses: No âmbito das Forças Armadas: (a) é devido o uso do nome social e a atualização dos assentamentos funcionais e de todas as comunicações e atos administrativos para refletir a identidade de gênero do militar; (b) é vedada a reforma ou qualquer forma de desligamento fundada exclusivamente no fato de o militar transgênero ter ingressado por vaga originalmente destinada ao sexo/gênero oposto; (c) A condição de transgênero ou a transição de gênero não configura, por si só, incapacidade ou doença para fins de serviço militar, sendo vedada a instauração de processo de reforma compulsória ou o licenciamento ex officio fundamentados exclusivamente na identidade de gênero do militar.


Informações Adicionais


Legislação


Constituição Federal (CF), art. 1º, III; e art. 3º, IV.


Decreto n. 8.727/2016.


Lei n. 6.880/1980 (Estatuto dos Militares).


Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 947, § 3º; e art. 1.036 e seguintes.


Regimento Interno do STJ (RISTJ), 104-A, III.


Convenção Americana de Direitos Humanos


TERCEIRA TURMA


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Processo


REsp 2.222.428-MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Cônjuge supérsistite. Direito real de habitação. Último imóvel do casal antes do óbito. Exceção. Situações devidamente comprovadas. Tempo de habitação no imóvel. Irrelevância.


Destaque


O direito real de habitação do cônjuge supérstite deve recair sobre o último imóvel em que o casal foi domiciliado antes do óbito, salvo situações excepcionais devidamente comprovadas.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em saber se o direito real de habitação da cônjuge supérstite deve recair sobre o último imóvel em que o casal foi domiciliado antes do óbito ou sobre o imóvel em que habitaram por mais tempo.


O direito real de habitação, conforme o art. 1.831 do Código Civil, assegura ao cônjuge supérstite o direito de permanecer no imóvel destinado à residência da família.


A Terceira Turma do STJ firmou entendimento de que, como regra, o imóvel objeto do direito real de moradia deve ser aquele em que o casal tenha habitado por último.


No caso em julgamento, não se verificou a existência de exceções que justifiquem a relativização do direito real de habitação, como a percepção de pensão vitalícia pela cônjuge supérstite ou a posse de outros bens imóveis pelos herdeiros.


Conclui-se que deve ser reconhecido o direito real de moradia da cônjuge supérstite em relação ao último imóvel em que o casal habitava.


Informações Adicionais


Legislação


Código Civil (CC), art. 1.831.


Processo


REsp 2.155.235-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO DO CONSUMIDOR


Tema


Responsabilidade civil objetiva. Hotel. Área de recreação. Acidente de consumo. Queda de extintor. Falha na Fixação. Criança hospedada no estabelecimento. Fato do serviço. Risco da Atividade. Danos materiais, morais e estéticos configurados.


Destaque


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Há responsabilidade civil de estabelecimento hoteleiro que, em razão da fixação inadequada de extintor de incêndio de grande porte em suas dependências, causa acidente que resulta em graves danos à saúde de menor de idade.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em verificar se há responsabilidade civil de hotel em acidente sofrido por menor de idade à época, hospedado no estabelecimento, e, consequentemente, se é devida indenização por danos morais, estéticos e materiais em virtude do evento danoso.


No caso, criança com 05 (cinco) anos de idade à época do fato, enquanto brincava na área de recreação infantil, foi atingida por extintor de incêndio de grande porte que caiu sobre ela, causando-lhe graves lesões em seis costelas, além do rompimento do fígado, o que ensejou pedido de reparação por danos materiais, morais e estéticos.


O Código de Defesa do Consumidor estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviço, na hipótese de defeito na sua prestação, e, desde que demonstrado o nexo causal entre o defeito do serviço e o acidente de consumo ou fato do serviço.


A culpa in vigilando dos pais da criança estaria configurada se os responsáveis não tivessem exercido, como deveriam, o dever de vigiar, de fiscalizar e de promover a segurança do menor, que, dada sua pouca idade, poderia não ter a plena capacidade de discernimento acerca de uma situação de risco. É certo que a avó se encontrava no quiosque acompanhando a criança, mas sua simples presença não seria, por si só, suficiente para impedir a ocorrência do acidente.


Com efeito, o homem médio - parâmetro representativo de um indivíduo dotado de prudência e inteligência comuns - jamais poderia prever que um extintor estivesse afixado inadequadamente, em condições de se soltar e, mesmo, de tombar sobre alguém.


Em ambientes de recreação, os pais e responsáveis presumem que as instalações tenham sido projetadas e devidamente preparadas para receber crianças, as quais não possuem discernimento suficiente para identificar eventuais riscos.


Ao disponibilizar área destinada ao público infantil, gera-se nos usuários a legítima e inafastável expectativa de que o ambiente seja integralmente seguro, concebido com especial atenção ao reduzido discernimento das crianças, seres em pleno estágio de formação e, portanto, especialmente vulneráveis.


O risco inerente à atividade não pode ser transferido aos consumidores, que nem sequer possuíam conhecimento prévio acerca das instalações. Admitir o contrário implicaria verdadeiro contrassenso diante dos deveres legais que recaem sobre o fornecedor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor.


Conclui-se que, em tal hipótese, deve ser reconhecida a responsabilidade civil do hotel, impondo-lhe o dever de reparar integralmente os danos sofridos, em estrita observância ao regime protetivo do consumidor e ao princípio da confiança legítima que norteia as relações de consumo.


Processo


REsp 2.104.647-SP, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Rel. para acórdão Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Permuta entre magistrados. Violação ao princípio do juiz natural. Ausência. Art. 43 do CPC (Perpetuação da jurisdição). Nulidade inexistente.


Destaque


O princípio da perpetuação da jurisdição pode ser excepcionado em decorrência de acordo celebrado entre os juízos permutantes, para que cada qual sentencie os processos nos quais colhida diretamente a prova oral antes da substituição.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em definir se o princípio da perpetuação da jurisdição pode ser excepcionado em decorrência de acordo celebrado entre os juízos permutantes, para que cada qual sentencie os processos nos quais colhida diretamente a prova oral antes da substituição.


Segundo o artigo 43 do CPC, a competência é fixada no momento do registro ou distribuição da ação, sendo vedado ao magistrado de juízo diverso sentenciar o feito sem autorização prévia, sob pena de violação ao princípio do juiz natural, que impõe a tipicidade e a indisponibilidade da competência jurisdicional.


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite exceções ao princípio do juiz natural quando presentes causas objetivas e previamente autorizadas pela administração do tribunal, como mutirões ou redistribuições para equalização de acervos.


No caso, a sentença foi proferida por juiz que não mais exercia jurisdição em Vara Cível de São Paulo, com base em acordo de cooperação celebrado com o juízo permutante, que visava preservar o princípio da identidade física do juiz. Os juízos pactuaram, antes da permuta, que cada qual permaneceria responsável por sentenciar os processos em que presidiu a colheita da prova oral.


O Tribunal de origem ressaltou que a Presidência do TJSP autorizou a atuação de magistrada na Vara Cível, conforme ato formal devidamente publicado no Diário da Justiça Eletrônico.


De fato, em consulta ao Diário da Justiça Eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do dia 23/6/2022, é possível verificar que a Presidência daquela Corte designou a magistrada sentenciante para que auxiliasse a Vara Cível do Foro Central, sem prejuízo da sua vara, inclusive na data da prolação sentença (12/5/2022).


Ou seja, embora a publicação tenha ocorrido no DJe em data posterior (23/6/2022), a designação foi feita com efeito retroativo, alcançando expressamente a data em que proferida a sentença, inexistindo nulidade processual, portanto.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 43.


QUARTA TURMA


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Processo


REsp 2.221.650-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Disponibilização de dados pessoais não sensíveis. Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Lei do Cadastro Positivo. Ausência de consentimento prévio. Ausência de dano moral presumido (in re ipsa).


Destaque


A disponibilização de dados pessoais, por si só, não configura dano moral presumido, sendo imprescindível a comprovação de que a conduta do gestor de banco de dados resultou em abalo significativo aos direitos de personalidade do titular.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia a saber se a simples disponibilização de dados pessoais de consumidores, sem sua prévia comunicação e consentimento, a consulentes que desejam utilizar esse banco de dados, dá ensejo à indenização por danos morais.


A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei n. 13.709/2018) remete à legislação específica a delimitação das situações em que o tratamento de dados pessoais se enquadra em atividades voltadas à proteção do crédito. Nesse sentido, a Lei do Cadastro Positivo (Lei n. 12.414/2011), que trata especificamente do sistema de credit scoring, não confere autorização para que os gestores compartilhem livremente dados pessoais de terceiros com eventuais consulentes.


A Lei do Cadastro Positivo prescreve expressamente que o gestor está autorizado a compartilhar as informações cadastrais e de adimplemento armazenadas com outros bancos de dados, bem como disponibilizar a consulentes apenas a nota de crédito, não contemplando a possibilidade de repasse a terceiros de outros dados ou histórico de crédito sem a anuência expressa do titular, o que reforça o caráter restritivo e protetivo da norma.


Conclui-se, então, que, embora os gestores de bancos de dados para proteção de crédito possam realizar o tratamento de dados pessoais de terceiros e, inclusive, abrir cadastro sem prévio consentimento do cadastrado, em regra, não estão autorizados a disponibilizar tais dados a terceiros sem o consentimento prévio de seus titulares.


Contudo, a disponibilização de dados pessoais de terceiros, por si só, ainda que não autorizada, não gera direito à indenização por dano moral. Com efeito, diferentemente dos dados sensíveis, cuja proteção é reforçada em razão de seu potencial discriminatório, os dados pessoais correspondem às informações ordinárias, frequentemente fornecidas em cadastros diversos, inclusive em plataformas digitais de uso cotidiano, não estando, via de regra, submetidos a regime jurídico de sigilo.


Assim, para que se configure dano moral nesses casos, é necessário que o titular comprove efetivamente que os seus dados pessoais foram ilegalmente disponibilizados, compartilhados ou comercializados pelos gestores de bancos de dados para proteção de crédito e que esse fato resultou em abalo significativo aos seus direitos de personalidade. Nesse sentido, a Segunda Turma do STJ também já decidiu no AREsp 2.130.619/SP, julgado em 7/3/2023, que o vazamento de informações pessoais de terceiros, por si só, não gera danos morais presumidos (in re ipsa).


Informações Adicionais


Legislação


Lei n. 13.709/2018


Lei n. 12.414/2011


Processo


REsp 2.205.708-PR, Rel. Ministra, Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Execução de título extrajudicial. Cédula de crédito bancário assinada eletronicamente. Plataforma não vinculada ao ICP-Brasil. Validade da assinatura eletrônica.


Destaque


Os documentos eletrônicos podem ter sua autoria e integridade comprovada, ainda que utilizados certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia reside em saber se o magistrado pode, de ofício, afastar a eficácia de um título executivo extrajudicial sob o argumento de que as assinaturas eletrônicas nele apostas não possuem certificação emitida pelo sistema da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil.


Tendo o título de crédito sido assinado pelo executado, o que indica tenha ele aceito a utilização do meio de assinatura empregado, não cabe ao magistrado, de ofício, afastar sua validade para impedir a citação da parte devedora, a quem caberá efetuar o pagamento ou opor as defesas que entender cabíveis.


A Corte estadual entendeu que não se pode confirmar a autenticidade das assinaturas existentes no suposto título executivo extrajudicial, pois "as assinaturas das partes contratantes foram realizadas digitalmente, por meio da plataforma "Sisbr". Ao assim decidir, o acórdão violou o disposto no art. 10, § 2º, da MP n. 2.200-2.


Ademais, a jurisprudência do STJ reconheceu que a Lei n. 14.620/2023, ao acrescentar o § 4º ao art. 784 do CPC, passou a admitir - na constituição e ateste de títulos executivos extrajudiciais em meio eletrônico - qualquer modalidade de assinatura eletrônica desde que sua integridade seja conferida pela entidade provedora desse serviço, evidenciando a ausência de exclusividade da certificação digital do sistema ICP-Brasil.


A exigência de certificação exclusiva pela ICP-Brasil, nas relações privadas pré-processuais, representa excesso de formalismo e contraria a intenção legislativa de conferir validade jurídica a assinaturas eletrônicas em geral, observada a autonomia das partes e os níveis de autenticação adotados.


Assim, não é possível ao magistrado afastar, de ofício, a validade jurídica de título de crédito com assinatura eletrônica, apenas pelo fato de a autenticação da assinatura ter sido feita por uma entidade sem credenciamento no sistema ICP-Brasil.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 784, § 4º


MP n. 2.200-2, art. 10, § 2º


quarta-feira, 12 de novembro de 2025

RESUMO. INFORMATIVO 870 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 870 DO STJ.


CORTE ESPECIAL


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Processo


APn 1.079-DF, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 15/10/2025, DJEN 23/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PENAL


Tema


Resolução CNJ n. 492/2023. Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Violência doméstica cometida por Desembargador. Competência do Superior Tribunal de Justiça. Lesão corporal. Art. 129 do Código Penal. Autoria e materialidade. Prova pericial e oral. Suficiência. Palavra da vítima. Relevante valor probatório. Dano moral in re ipsa.


Destaque


1. O Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar Desembargadores em crimes sem relação com o cargo, de modo a garantir a imparcialidade do julgamento.


2. A palavra da vítima, corroborada por provas periciais e testemunhais, possui relevante valor probatório em crimes de violência doméstica.


3. A tese de autolesão e interesse patrimonial da vítima não encontra suporte nas provas e reforça estereótipos de gênero ultrapassados.


4. Natureza in re ipsa do dano moral decorrente de atos de violência doméstica e familiar contra a mulher.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em saber se o Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar Desembargador por crime não relacionado com o exercício do cargo; se o réu praticou o delito de lesão corporal contra cônjuge, prevalecendo-se das relações domésticas, conforme descrito na denúncia, e se haveria elementos suficientes para sua condenação, bem como se é cabível indenização por dano moral.


No que tange à competência, o STJ é competente para julgar os delitos praticados por desembargadores, ainda que os fatos não tenham relação com o exercício do cargo, considerando que o processamento e o julgamento do feito por magistrado de primeiro grau de jurisdição vinculado ao mesmo Tribunal poderiam afetar a independência e a imparcialidade que orientam a atividade jurisdiciona (APn n. 943/DF, relator Ministro Jorge Mussi, Corte Especial, julgado em 20/4/2022, DJe de 12/5/2022).


Ademais, o presente julgamento seguiu as diretrizes constantes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (Resolução CNJ n. 492/2023) na análise dos crimes praticados no contexto de violência doméstica e familiar.


Em relação à lesão corporal, foi imputado ao desembargador de justiça o delito previsto no art. 129, § 9º, do Código Penal, com a redação dada pela Lei n. 11.340/2006, por lesão corporal contra cônjuge em contexto de violência doméstica, com pedido de indenização por danos morais e materiais à vítima.


A lesão física foi demonstrada por meio de boletim de ocorrência, perícia traumatológica, prova testemunhal produzida na fase da investigação (ratificada na fase da persecução penal) e declarações da vítima.


A lesão à saúde mental da vítima ficou comprovada nos Laudos Psicossociais elaborados por Equipe Multidisciplinar do Tribunal de Justiça, nos termos da orientação preceituada no Enunciado n. 74 do FONAVID (A configuração da materialidade do crime de lesão à saúde mental previsto no art. 129 do Código Penal dependerá de perícia psicológica ou psiquiátrica que deverá ser realizada com perspectiva de gênero).


A autoria também foi demonstrada de modo suficiente, conforme depoimentos de testemunhas e vítima. A palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, possui relevante valor probatório, especialmente em crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher.


Apesar das agressões à vítima terem se dado em um contexto de briga do casal, não houve demonstração de que o réu agiu em legítima defesa ou de que as agressões físicas foram recíprocas, tampouco de que o réu fez uso moderado de meios para afastar uma suposta agressão injusta proveniente da vítima. Também não merece prosperar a tese defensiva de que a vítima teria interesse patrimonial na relação e que, por isso, teria ferido a si mesma, registrando o boletim de ocorrência posteriormente sem justificar, em suas declarações, o hiato havido.


Tal tese, além de colocar sob suspeição o trabalho técnico do Instituto de Medicina Legal estadual - como se a médica legista que atendeu a vítima não tivesse a qualificação necessária para discernir uma autolesão de uma lesão provocada por terceiro -, aparentemente busca imputar à vítima a responsabilidade pela agressão sofrida, reforçando os ultrapassados estereótipos de gênero lamentavelmente presentes ainda hoje em nossa sociedade e no próprio sistema de justiça.


Ressalta-se ainda que o fato de a vítima - após o registro do boletim de ocorrência e o deferimento das medidas protetivas - ter realizado ligações para o réu, enviando mensagens pedindo que o relacionamento fosse reatado, não basta para obliterar as provas constantes dos autos, sendo também um comportamento usual nos casos de violência doméstica e familiar, especialmente quando há dependência econômico-financeira. Nesse contexto, o receio de não conseguir sustentar a si ou a sua família, assinalado pela vítima, que a motivou a procurar o réu mesmo na vigência das medidas protetivas, não constitui episódio isolado no denominado ciclo de violência.


Quanto ao pedido de indenização, o dano moral suportado pela vítima é inconteste, derivado do próprio ato ofensivo, que, no caso presente, é tipificado como crime previsto no art. 129, § 9º, do Código Penal, sua natureza é de dano presumido (damnum in re ipsa), de tal modo que, provado o fato gerador da dor, do abalo emocional, do sofrimento, está demonstrado o dano moral, numa presunção natural, que decorre das regras de experiência comum.


Sob esse enfoque e considerando a demonstração de nexo entre o delito apurado nos presentes autos e os danos psicológicos e emocionais atestados nos laudos psicossociais elaborados pela equipe multidisciplinar do Tribunal estadual, com a presença de efeitos ainda na vida atual da vítima, e considerando a culpabilidade elevada do réu, assim como sua renda líquida declarada, deve ser fixado valor indenizatório, a título de danos morais, corrigidos monetariamente a partir do arbitramento e com juros de mora contados da data do evento.


Informações Adicionais


Legislação


Código Penal (CP), art. 129, § 9º


Processo


EDcl no AgInt no CC 196.645-SP, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 14/10/2025, DJEN 17/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Carta precatória. Oitiva de testemunhas. Possibilidade de realização do ato processual por videoconferência. Resolução 105/2010 - CNJ.


Destaque


Nos locais em que existente sala passiva, a deprecação há de limitar-se à disponibilização desta em data e hora previamente agendada, intimação de quem necessário e demais atos preparatórios de modo que o magistrado efetivamente competente cumpra, sequencialmente, seu dever de oitiva das partes e testemunhas.


Informações do Inteiro Teor


Este conflito de competência busca discutir a viabilidade da carta precatória expedida pelo juiz federal ao juiz de direito, destinada à oitiva de testemunhas, em ação previdenciária na qual a segurada postula a concessão da aposentadoria rural por idade em face do Instituto Nacional do Seguro Social.


Em casos análogos ao presente, o STJ vinha adotando o entendimento de que "a prática de atos processuais por videoconferência é uma faculdade do juízo deprecante, não competindo ao juízo deprecado a determinação de forma diversa da realização de audiência" (CC 165.381/MG, relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe de 14/6/2019).


Ocorre que, a Primeira Seção considerou que, neste caso específico, estaria havendo uma subversão da aplicação da norma prevista no art. 267 do CPC, de modo a autorizar a realização de distinguishing em relação à jurisprudência consolidada.


Com efeito, o princípio da cooperação nacional previsto no art. 67 do CPC impõe aos órgãos do Poder Judiciário o dever de cooperar entre si para a prestação de uma tutela jurisdicional mais célere e efetiva, viabilizando a obtenção de resultados máximos, com menor dispêndio de tempo e custos. Nos termos do inc. II do § 2º do art. 69 do CPC, os atos dos juízes cooperantes poderão consistir no estabelecimento de procedimento para a obtenção e apresentação de provas e a coleta de depoimentos.


Na mesma linha, a Resolução 105/2010 do Conselho Nacional de Justiça - alterada pela Resolução 326/2020 - dispõe em seu art. 3º que "quando a testemunha arrolada não residir na sede do juízo em que tramita o processo, deve-se dar preferência, em decorrência do princípio da identidade física do juiz, à expedição da carta precatória para a inquirição pelo sistema de videoconferência". Ainda, no § 2º do referido dispositivo, consta que "a direção da inquirição de testemunha realizada por sistema de videoconferência será do juiz deprecante".


Assim sendo, o STJ passou a adotar o entendimento de que, "nos locais em que existente sala passiva, a deprecação há de limitar-se à disponibilização desta em data e hora previamente agendada, intimação de quem necessário e demais atos preparatórios de modo que o magistrado efetivamente competente cumpra, sequencialmente, seu dever de oitiva das partes e testemunhas".


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 67; art. 69, § 2º, II; e art. 267.


Resolução 105/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), art. 3º, caput e § 2º


SEGUNDA SEÇÃO


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Processo


CC 214.451-SP, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 16/9/2025, DJEN 19/9/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Obrigação de fazer e indenização por danos materiais e morais. Pedido de reativação de conta em plataforma digital de delivery. Bloqueio. Relação jurídica de natureza civil. Competência da Justiça Comum Estadual. Justiça do Trabalho. Incompetente.


Destaque


Compete à Justiça Comum Estadual (e não à Justiça do Trabalho) o julgamento da demanda relativa a bloqueio de conta em plataforma digital de delivery, se não houver pedido de reconhecimento de vínculo trabalhista ou verbas típicas da relação de trabalho.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em definir se a demanda, relativa a pedido de reativação de conta bloqueada em plataforma digital de delivery, sem pedido de reconhecimento de vínculo trabalhista ou verbas típicas da relação de trabalho, deve ser processada e julgada pela Justiça do Trabalho ou pela Justiça Comum Estadual.


A competência da Justiça Comum ou da Justiça do Trabalho é definida a partir da causa de pedir e dos pedidos formulados, em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.


Não havendo pedido de reconhecimento de vínculo de emprego nem verbas de natureza trabalhista, a controvérsia decorre de contrato de natureza civil firmado com a plataforma digital de delivery, sendo compete a Justiça Comum Estadual em detrimento da Justiça do Trabalho, portanto.


Ademais, a jurisprudência do STJ entende que a competência para julgar pretensões relacionadas ao bloqueio ou exclusão de contas e indenizações correspondentes pertença à justiça comum.


TERCEIRA TURMA


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Processo


REsp 2.204.888-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 4/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Contrato de seguro de vida. Morte do segurado. Discussão sobre o suicídio ou agravamento de risco. Embriaguez. Afastamento da aplicação do art. 768 do CC. Perda do direito à garantia pelo agravamento intencional do risco. Indenização securitária devida.


Destaque


A conduta da "roleta-russa", embora temerária, quando comprovadamente realizada sem a intenção suicida e sob o efeito de embriaguez, não é causa para a perda de indenização do seguro de vida.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em decidir se resta configurado o agravamento intencional de risco quando o segurado, em estado de embriaguez, vai a óbito depois de atirar contra si com uma arma que acreditava não funcionar.


O art. 768 do CC disciplina que "o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato".


Somente uma conduta imputada ao segurado, que, por dolo ou culpa grave, incremente o risco contratado, dá azo à perda da indenização securitária.


A presunção de boa-fé somente será afastada se existirem provas da má-fé do segurado que intencionalmente agravou o risco do contrato.


No contrato de seguro de vida, consolidou-se, a orientação mais benéfica ao consumidor, no sentido de afastar o pagamento da apólice tão somente quando ocorrer suicídio dentro dos dois primeiros anos de contrato. Nas demais situações, ocorrendo o sinistro morte do segurado e inexistente a má-fé dele, a indenização securitária deve ser paga ao beneficiário, visto que a cobertura do seguro de vida é ampla.


No seguro de vida, é vedada a exclusão de cobertura na hipótese de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas.


A conduta de atirar em si mesmo só poderia ser classificada como suicídio se a pessoa tivesse a intenção de morrer. A percepção sobre a realidade é o que transforma o ato de um potencial suicídio em uma fatalidade culposa. Ademais, porque, nos termos da jurisprudência supracitada, os acidentes que levam à morte, se foram decorrentes de embriaguez, em regra, não justificam a perda da garantia do seguro de vida.


Nesse sentido, a Súmula 620/STJ dispõe: "a embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida".


A conduta da "roleta-russa", embora temerária, quando comprovadamente realizada sem a intenção suicida e sob o efeito de embriaguez, não é causa para a perda de indenização do seguro de vida.


No caso analisado, embora o segurado tenha atirado contra si, o fato de esse ato ter sido decorrente de embriaguez e sem a intenção deliberada de tirar a própria vida afasta a aplicação do art. 768 do Código Civil.


Informações Adicionais


Legislação


Código Civil (CC), art. 768.


Processo


REsp 2.204.902-RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL, DIREITO DA SAÚDE


Tema


Plano de saúde. Criança diagnosticada com alergia à proteína do leite de vaca. Prescrição de fórmula à base de aminoácidos. Configuração medicamentosa. Irrelevância. Tecnologia em saúde recomendada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) e incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS). Tratamento até dois anos de idade. Cobertura pela operadora. Obrigatoriedade.


Destaque


A operadora do plano de saúde é obrigada a cobrir a fórmula à base de aminoácidos (Neocate) para o tratamento de crianças com alergia à proteína do leite de vaca, conforme recomendação da Conitec e incorporação da tecnologia ao SUS, limitada até os dois anos de idade.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia a saber se a operadora do plano de saúde tem a obrigação de cobertura de fórmula à base de aminoácidos prescrita para o tratamento da beneficiária diagnosticada com alergia à proteína do leite de vaca.


No caso, a criança beneficiária do plano foi diagnosticada com "enterocolite, reflexo gastroenofogico e angroedema em decorrência de alergia à proteína do leite de vaca (CID R63-8), necessitando utilizar leite de aminoácidos (Neocate) 10 (dez) latas por mês, conforme laudo médico". A operadora do plano de saúde indeferiu o pedido de cobertura por ausência de previsão no contrato e no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).


Com efeito, a fórmula à base de aminoácido - Neocate - é registrada na Anvisa na categoria de alimentos infantis.


No entanto, de acordo com os registros da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec), a fórmula nutricional à base de aminoácidos foi incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Portaria n. 67/2018 do Ministério da Saúde, como tecnologia em saúde para tratamento de crianças de 0 a 24 meses diagnosticadas com alergia à proteína do leite de vaca (APLV).


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Infere-se, portanto, que, embora, de fato, não se trate de um medicamento, a fórmula à base de aminoácidos constitui, em circunstâncias como a analisada, tecnologia em saúde reconhecida pela Conitec como diretriz terapêutica para crianças de 0 a 24 meses, diagnosticadas com APLV, considerando, sobretudo, o alerta do Ministério da Saúde acerca da importância do aleitamento para a saúde e o bom desenvolvimento das crianças menores de 2 anos de idade, com a orientação, inclusive, de que até os 6 meses nenhum outro tipo de alimento, senão o leite, lhes seja oferecido.


Nessa toada, a despeito de não constar do rol da ANS, considerando a recomendação positiva da Conitec e a incorporação da tecnologia em saúde ao SUS, desde 2018, deve ser mantido a obrigação de cobertura da fórmula à base de aminoácidos - Neocate -, observada, todavia, a limitação do tratamento até os 2 (dois) anos de idade.


Informações Adicionais


Legislação


Portaria n. 67/2018 do Ministério da Saúde


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Processo


REsp 2.091.358-DF, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/9/2025, DJEN 19/9/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Despejo por falta de pagamento. Cobrança. Aluguéis. Encargos. Prestações Sucessivas. Vencidas e vincendas. Inclusão na condenação. Petição inicial. Interpretação lógico-sistemática. Art. 323 do CPC. Aplicabilidade. Pedido pormenorizado na inicial ou curso do processo. Desnecessidade.


Destaque


As prestações periódicas relativas aos encargos locatícios vencidos após o ingresso em juízo até a efetiva desocupação do imóvel devem ser incluídas na condenação, independentemente de pedido pormenorizado do autor na inicial ou no curso da demanda.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em definir se é possível incluir na condenação todos os encargos locatícios vencidos e vincendos até a efetiva desocupação do imóvel, mesmo aqueles não discriminados de forma pormenorizada na petição inicial.


Na origem, trata-se de ação de despejo por falta de pagamento cumulada com cobrança de aluguéis e acessórios da locação. O Tribunal a quo indeferiu pedido de inclusão, na condenação, das prestações periódicas relativas aos encargos locatícios vencidos no curso da demanda, sob o fundamento de que tal providência exigiria pedido pormenorizado na inicial ou no curso da demanda.


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que a pretensão exposta na petição inicial deve ser analisada a partir de uma interpretação lógico-sistemática, que leva em conta todo o conteúdo da exordial, e não apenas o capítulo destinado à formulação dos pedidos.


O art. 323 do CPC estabelece que, nas ações que tiverem por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, estas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor. Por conseguinte, tal dispositivo é aplicável às prestações periódicas relativas aos encargos locatícios, de modo que deve ser considerado implícito o pedido de condenação às parcelas vencidas no curso da demanda.


Conclui-se que as prestações periódicas relativas aos encargos locatícios vencidos após o ingresso em juízo até a efetiva desocupação do imóvel devem ser incluídas na condenação, independentemente de pedido pormenorizado do autor na inicial ou no curso da demanda.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 323.


QUARTA TURMA


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Processo


REsp 2.060.852-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Ação civil pública. Dano moral coletivo. Trote universitário. Contexto jocoso. Grupo restrito de estudantes. Amplificação digital por terceiros. Ausência dos requisitos configuradores.


Destaque


As declarações proferidas durante trote universitário, dirigidas a grupo específico e posteriormente divulgadas em redes sociais, não configuram dano moral coletivo.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia restringe-se a determinar se as declarações proferidas por veterano durante trote universitário, dirigidas a grupo de calouros e posteriormente divulgadas em redes sociais por terceiros, podem configurar dano moral coletivo.


Na ocasião, sob o pretexto de apresentar o hino da instituição, calouros do curso de medicina foram conduzidos por um ex-aluno do mesmo curso, convidado para participar do trote universitário, a entoar juramento com palavreado vulgar de conteúdo misógino, sexista e pornográfico.


Em razão de tal fato, o Ministério Público ajuizou ação civil pública para condenação do ex-aluno ao pagamento de indenização por danos morais coletivos.


O dano moral coletivo constitui instituto jurídico de aplicação excepcional, que demanda demonstração rigorosa de efetiva lesão aos valores fundamentais compartilhados pela coletividade, não se confundindo com mera reprovação moral de determinada conduta.


Para a caracterização do dano moral coletivo, impõe-se a presença cumulativa dos seguintes elementos: (i) conduta antijurídica; (ii) lesão a interesse transindividual; (iii) nexo de causalidade; e (iv) gravidade objetiva da lesão.


A mera capacidade de mobilização da opinião pública digital não constitui parâmetro juridicamente idôneo para aferir a gravidade objetiva da lesão exigida para caracterização do dano coletivo, sob pena de banalização do instituto.


O segundo elemento (lesão a interesse transindividual) exige demonstração de ofensa a valores fundamentais compartilhados pela coletividade, com potencial de abalar a ordem social ou atingir direitos de grupos determinados.


No caso sob análise, as manifestações foram dirigidas a grupo específico e restrito de estudantes universitários, em evento privado, sem intenção inicial de divulgação ampla. A posterior repercussão em redes sociais decorreu de ação de terceiros, circunstância não provocada diretamente pelo ex-aluno.


É fundamental reconhecer que os efeitos das declarações na esfera pessoal devem ser analisados casuisticamente, em relação a cada um dos participantes do evento. Nem todos necessariamente sofreram o mesmo impacto, devendo-se considerar: a percepção individual do contexto; o grau de constrangimento efetivamente experimentado; a capacidade de discernimento sobre a natureza das manifestações; e a participação voluntária no evento.


Assim, embora o conteúdo das declarações seja moralmente reprovável e mereça censura social, os fatos descritos - contexto jocoso, participação voluntária dos envolvidos, ausência de reação negativa imediata e direcionamento a grupo específico e restrito - evidenciam que a tutela jurídica adequada se situa no plano da responsabilidade individual, não configurando lesão a interesse transidividual apta a ensejar reparação coletiva.


Saiba mais:


· Informativo de Jurisprudência n. 832


· Informativo de Jurisprudência n. 815


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Processo


Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025, DJEN 23/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Execução de alimentos. Morte do menor exequente. Alimentos vencidos. Obrigação já constituída. Transmissibilidade de crédito. Sub-rogação. Não ocorrência. Sucessão cabível.


Destaque


Os alimentos vencidos e não pagos no curso da execução configuram crédito concreto do alimentado, incorporando-se ao seu patrimônio, sendo, portanto, transmissíveis aos seus herdeiros.


Informações do Inteiro Teor


O direito à prestação alimentar é personalíssimo do alimentando, o que enseja a impossibilidade de outrem reclamar a continuidade da obrigação, quando falecido o alimentando.


No caso, no entanto, não se cuida de pretensão de suceder o alimentando no direito de ser alimentado, de forma a receber as prestações que se venceriam após a sua morte, mas de sucessão em decorrência de falecimento do credor dos alimentos, no que tange às parcelas vencidas.


Com efeito, os alimentos vencidos e não pagos no curso da execução configuram crédito do alimentado, incorporando-se ao seu patrimônio, sendo, portanto, transmissível aos seus herdeiros.


O fundamento para essa compreensão reside no reconhecimento de que a prestação alimentar vencida já representa um direito consolidado do credor, não mais dependendo de vínculo de dependência, afetivo ou familiar, com o devedor. Negar essa possibilidade significaria reduzir a obrigação alimentar a um vínculo meramente moral, desprovido de eficácia patrimonial, o que contraria não apenas a função social da obrigação alimentar, mas também a lógica do sistema jurídico que reconhece como crédito transmissível qualquer valor vencido e não quitado.


Ou seja, constituindo crédito de cunho patrimonial, os alimentos vencidos perdem o caráter personalíssimo, sendo cabível a transmissão, à luz dos dispositivos que regem a sucessão processual.


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Processo


REsp 2.206.445-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Embargos à execução. Protocolização. Simples petição. Autos da ação executiva. Vício procedimental sanável. Princípio da instrumentalidade das formas. Tempestividade da manifestação defensiva. Regularização posterior. Ausência de prejuízo. Primazia da solução do mérito.


Destaque


Em observância ao princípio da instrumentalidade das formas, a protocolização de embargos à execução nos autos da ação executiva, em desconformidade com o art. 914, § 1º, do CPC, configura vício sanável, desde que o ato alcance sua finalidade essencial e seja posteriormente regularizado em prazo razoável, sem prejuízo ao contraditório.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia busca definir se a protocolização de embargos à execução nos próprios autos da ação executiva, em desconformidade com o art. 914, § 1º, do CPC, configura erro grosseiro insuscetível de correção pelo princípio da instrumentalidade das formas, ou se tal vício procedimental pode ser sanado quando o ato, embora formalmente irregular, alcança sua finalidade essencial e é posteriormente regularizado dentro de prazo razoável.


Os embargos à execução, disciplinados nos arts. 914 e seguintes do Código de Processo Civil, constituem ação incidental autônoma, mediante a qual o executado pode se opor à execução forçada de título extrajudicial. Sua natureza jurídica de ação impõe, em princípio, o cumprimento rigoroso do procedimento estabelecido em lei, notadamente a distribuição por dependência prevista no § 1º do art. 914.


No caso, embora o embargado tenha adotado procedimento formalmente irregular ao protocolar simples petição nos autos da execução, em vez de distribuir ação autônoma, manifestou inequivocamente sua intenção de embargar a execução dentro do prazo legal de quinze dias estabelecido pelo art. 915 do CPC. Ainda, a petição inicial cumpriu integralmente sua função essencial de comunicar aos exequentes a oposição tempestiva e de interromper o curso da execução.


Considerando que a parte utilizou o instrumento processual adequado para impugnar a execução e o fez tempestivamente, mostra-se apropriada a aplicação dos princípios da instrumentalidade e da economia processual, permitindo-se a regularização mediante posterior distribuição por dependência. A essência da manifestação defensiva foi preservada, não havendo comprometimento dos direitos fundamentais envolvidos.


O equívoco procedimental verificado configura vício de natureza sanável, especialmente quando examinado sob o prisma dos direitos constitucionais de defesa e do princípio da efetividade processual. Os exequentes obtiveram conhecimento imediato da resistência oferecida, sem experimentar prejuízo material algum decorrente da irregularidade formal, enquanto a subsequente correção do procedimento atendeu adequadamente às exigências legais sem afetar o contraditório.


O Tribunal de origem, ao caracterizar a conduta como "erro escusável" e aplicar o princípio da instrumentalidade das formas, demonstrou perfeita sintonia com os valores que informam o sistema processual vigente. A decisão revela equilíbrio adequado entre o respeito às formas legais - que não foi desprezado, mas apenas atenuado, diante das circunstâncias específicas do caso - e a necessidade de evitar formalismos excessivos que comprometam a efetividade do processo.


Ademais, a natureza do erro verificado não se enquadra na categoria de "erro grosseiro" invocada pela parte recorrente. Trata-se, antes, de equívoco procedimental compreensível, praticado por advogado no exercício regular de sua atividade profissional, sem nenhuma intenção de burlar as regras processuais ou causar prejuízo à parte contrária. A aplicação do art. 277 do CPC, longe de representar condescendência indevida com a irregularidade, constitui expressão legítima do princípio da instrumentalidade das formas em sua acepção mais depurada.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 277, art. 914, § 1º, e art. 915


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Processo


Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 27/10/2025, DJEN 3/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


Tema


Defensoria pública. Prazo em dobro. ECA. Alteração legislativa. Vedação apenas à Fazenda pública e ao Ministério Público. Silêncio eloquente. Defensoria pública. Prerrogativa mantida. Princípio da indeclinabilidade. Sobrecarga de trabalho. Isonomia material.


Destaque


A prerrogativa de prazo em dobro para a Defensoria Pública aplica-se aos procedimentos regulados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em saber se o art. 152, § 2º, do ECA, afasta a prerrogativa da Defensoria Pública de contagem em dobro dos prazos processuais, conforme estabelecido nos arts. 128, I, da LC n. 80/1994 e 186, caput, do CPC.


Dispõe o art. 152, § 2º, do ECA que "Os prazos estabelecidos nesta Lei e aplicáveis aos seus procedimentos são contados em dias corridos, excluído o dia do começo e incluído o dia do vencimento, vedado o prazo em dobro para a Fazenda Pública e o Ministério Público".


Já o art. 128, I, da LC n. 80/1994 assevera que são prerrogativas dos membros da Defensoria Pública "receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos".


No mesmo sentido, o art. 186, caput, do CPC, sustenta que a Defensoria Pública "gozará de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais".


O legislador, ao editar a Lei n. 13.509/2017, que modificou o ECA, vedou expressamente o prazo em dobro apenas à Fazenda Pública e ao Ministério Público, excluindo a Defensoria Pública, o que configura escolha consciente, e não omissão legislativa.


A Defensoria Pública, diferentemente do Ministério Público e da Fazenda Pública, não dispõe da mesma estrutura institucional, recursos humanos e materiais, estando submetida ao princípio da indeclinabilidade, o que gera sobrecarga de trabalho desproporcional que justifica a concessão de prazos diferenciados.


O argumento de violação à isonomia entre as instituições baseia-se em concepção meramente formal de igualdade. A isonomia material exige tratar desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades, não configurando a prerrogativa do prazo em dobro privilégio injustificado, mas mecanismo de equalização destinado a garantir paridade real de armas no processo.


Assim, a celeridade dos procedimentos do ECA, embora constitucional e legalmente assegurada, não pode comprometer o direito fundamental ao acesso qualificado à justiça e à ampla defesa.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 186, caput;


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), art. 152, § 2º;


LC n. 80/1994, art. 128, I;

quarta-feira, 5 de novembro de 2025

RESUMO. INFORMATIVO 869 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 869 DO STJ.


PRIMEIRA TURMA


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Processo


REsp 2.125.340-RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. para acórdão Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por maioria, julgado em 14/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO TRIBUTÁRIO


Tema


Convênio entre o DETRAN estadual e os Cartórios do Registro Civil das Pessoas Naturais. Remuneração paga pelo DETRAN aos Centros de Registro de Veículos Automotores (CRVA). Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). Não incidência.


Destaque


Não incide o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre as atividades desempenhadas por titulares de serventias extrajudiciais em virtude de credenciamento efetuado por órgãos ou entidades estaduais de trânsito.


Informações do Inteiro Teor


O cerne da controvérsia reside em definir se incide o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) no tocante às atividades delegadas a titular de Registro Civil de Pessoas Naturais em virtude de convênio firmado com órgão ou entidade estadual de trânsito, à luz dos itens 21 e 21.01 da lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003.


O Tribunal estadual entendeu pela legalidade do lançamento sob o fundamento de que "o exercício de ações delegadas pelo Departamento Estadual de Trânsito [...], tais como registro inicial de veículos, transferência de propriedade, troca de placas, mudança de endereço e licenciamento, qualificam-se como serviços de registro público".


Nos termos do art. 156, III, da Constituição Federal, o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) está jungido ao conceito de serviço, o qual deve ser compreendido como a prestação de atividade economicamente apreciável, em caráter negocial e sob regime de direito privado, da qual resulte uma utilidade, material ou imaterial, em favor do respectivo tomador.


Assim, os itens 21 e 21.01 da lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003 viabilizam a incidência do tributo sobre serviços de registros públicos, cartorários e notariais, cuja concepção deve ser extraída da legislação que rege tais atividades. De acordo com as Leis n. 6.015/1973 e n. 8.935/1994, o conceito de registros públicos, cartorários e notariais não adota perspectiva subjetiva, mas, sim, teleológica, porquanto sua definição não diz com o sujeito responsável por sua prestação, atrelando-se, diversamente, às funções e às finalidades a eles inerentes, mais precisamente, as de garantir publicidade, conferir autenticação, atribuir eficácia ou emprestar segurança jurídica a atos negociais praticados por pessoas privadas.


A legislação autoriza os titulares de serventias extrajudiciais a exercerem, de maneira atípica, atividades de outra natureza, inclusive aquelas legalmente atribuídas aos órgãos ou entidades estaduais de trânsito, nos termos do art. 25 do Código de Trânsito Brasileiro, as quais, todavia, não se transmudam em serviços de registros públicos, cartorários ou notariais tão somente em virtude de caracteres inerentes ao sujeito responsável por seu desempenho.


Por sua vez, as atividades de registro, licenciamento, vistoria e inspeção, exercidas pelos Departamentos Estaduais de Trânsito (DETRAN), denotam aspectos predominantes do exercício do poder de polícia administrativa, sendo possível, à Administração Pública, mediante credenciamento, transferir a execução dos respectivos atos materiais ou instrumentais à iniciativa privada.


Assinale-se que o instituto do credenciamento não detém típico caráter negocial ou contratual, traduzindo apenas o assentimento do Poder Público com o exercício privado de atos instrumentais de polícia administrativa, sob ordem e fiscalização estatal, razão pela qual eventual coleta de dados de pessoas físicas ou jurídicas pelos credenciados não se qualifica como típico serviço de registro público, cartorário ou notarial, pois ausente a atribuição de autenticação, eficácia ou segurança jurídica a negócios jurídicos privados, elementos que lhes são inerentes.


Dessa modo, somente as atribuições típicas dos tabeliães, notários, oficiais de registro e registradores, nos moldes definidos na legislação, são encartadas como "serviços de registros públicos, notariais ou cartorários", legitimando-se, apenas nessa hipótese, a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) com arrimo nos itens 21 e 21.01 da lista de serviços constante da Lei Complementar n. 116/2003, sendo impróprio conferir igual caracterização a atividades de outra natureza.


Dessarte, as competências dos órgãos ou entidades estaduais de trânsito, conquanto possam redundar, em certa medida, na concessão de vantagens e utilidades aos administrados - expressando, assim, aspectos que tangenciam a prestação de serviços públicos -, detêm caracteres prevalecentes do exercício de poder de polícia, natureza jurídica que, evidentemente, não se altera pela mera transferência parcial da respectiva execução a pessoas de direito privado mediante de credenciamento atividades materiais ou instrumentais de apoio às ações do Poder Público.


Nesse aspecto, à vista da exegese dos itens 21 e 21.01 da lista anexa à Lei Complementar n. 116/2003, não incide o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) sobre as atividades desempenhadas por titulares de serventias extrajudiciais em virtude de credenciamento efetuado por órgãos ou entidades estaduais de trânsito, pois, nessa ambiência: a) preponderam aspectos atinentes ao exercício do poder de polícia; b) ausente caráter negocial entre credenciante e credenciado; c) não se verifica concessão de utilidade em prol do Poder Público, mas, sim, em favor do usuário e a título meramente mediato; d) tais atividades não são congêneres, tampouco inerentes aos serviços de registros públicos, cartorários e notariais, porquanto cometidas a pessoas privadas credenciadas à Administração Pública, que as exercem no interesse da segurança do trânsito, do tráfego e do uso regular dos meios de transporte, e não para atribuir eficácia, autenticidade ou publicidade a atos negociais entre particulares.


Informações Adicionais


Legislação


Lei Complementar n. 116/2003, itens 21 e 21.01 da lista anexa.


Constituição Federal, art. 156, III.


Lei n. 6.015/1973.


Lei n. 8.935/1994.


Código de Trânsito Brasileiro, art. 25.


Processo


REsp 2.018.676-MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025, DJEN 21/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO TRIBUTÁRIO


Tema


Isenção tributária. IPI. Motorista profissional autônomo (taxista). Primeira aquisição de veículo automotor. Exercício prévio da atividade. Desnecessidade.


Destaque


O direito à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na aquisição de veículo automotor para o exercício da atividade de taxista não exige o exercício anterior da referida atividade, bastando a existência prévia de autorização ou de permissão do Poder Público.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia consiste em saber se a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados na aquisição de veículo automotor, com fundamento na Lei n. 8.989/1995, depende da comprovação de que o beneficiário já esteja exercendo a atividade de taxista por ocasião da aquisição do veículo que se pretende isentar do IPI.


A isenção de IPI tem finalidade extrafiscal, política pública tributária destinada ao incentivo do exercício da atividade profissional por motoristas autônomos taxistas, estimulando a aquisição de veículo - nas condições especificadas em lei -, que serve como instrumento de trabalho.


Consoante prevê o art. 111, inciso II, do Código Tributário Nacional - CTN, a legislação tributária que confere outorga de isenção deve ser interpretada literalmente. Essa exigência, contudo, não impede o intérprete de considerar a finalidade e a coerência com o sistema jurídico, mas apenas veda a ampliação do benefício fiscal para além daquelas hipóteses que o legislador previu.


Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "o art. 111 do CTN, que prescreve a interpretação literal da norma, não pode levar o aplicador do direito à absurda conclusão de que esteja ele impedido, no seu mister de apreciar e aplicar as normas de direito, de valer-se de uma equilibrada ponderação dos elementos lógico-sistemático, histórico e finalístico ou teleológico, os quais integram a moderna metodologia de interpretação das normas jurídicas" (REsp 192.531/RS, rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 17/2/2005, DJ de 16/5/2005).


Nessa linha, conclui-se que não há, no art. 1º, I, da Lei n. 8.989/1995, exigência alguma de exercício prévio da atividade de taxista. A tese da Fazenda Nacional, ao condicionar a isenção a esse requisito, cria limitação não escrita pelo legislador.


De fato, a finalidade extrafiscal da norma e sua coerência do sistema normativo conduz ao entendimento de que a expressão presente no texto legal de "motoristas profissionais que exerçam" está relacionada com a destinação do veículo adquirido exclusivamente para atividade de taxista, bastando a existência prévia de autorização ou de permissão do Poder Público.


Restringir o benefício apenas aos taxistas já estabelecidos anteriormente na profissão equivaleria a reduzir o alcance social da lei, criando uma barreira injustificada ao ingresso de novos profissionais e incompatível com o objetivo da política pública.


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Por essa razão, a previsão do art. 1º, I, da Lei n. 8.989/1995 favorece tanto os taxistas que já exercem a profissão quanto os que desejam ingressar nela.


Informações Adicionais


Legislação


Lei n. 8.989/1995, art. 1º, I.


Código Tributário Nacional (CTN), art. 111, II.


SEGUNDA TURMA


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Processo


AREsp 2.694.218-SP, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 16/10/2025, DJEN 29/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO TRIBUTÁRIO


Tema




Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI. Isenção. Veículo automotor. Perda total. Transferência para seguradora. Isenção mantida.


Destaque


A transferência de veículo (sucata) por perda total para a seguradora, como condição ao recebimento de indenização securitária integral, antes do transcurso do prazo de 2 (dois) anos da data da aquisição, não se considera alienação para fins do art. 6º da Lei n. 8.989/1995, não ensejando a perda da isenção do IPI anteriormente deferida.


Informações do Inteiro Teor


No caso, trata-se de ação ajuizada por seguradora de veículos, objetivando a declaração de inexigibilidade do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI no ato de transferência, à seguradora, de veículo sinistrado, adquirido com isenção do tributo pelo segurado, antes de decorrido o prazo de dois anos da aquisição.


Com efeito, a Corte de origem, ao concluir pela "inexigibilidade do IPI na transferência à seguradora dos salvados de veículo adquirido anteriormente com a isenção prevista na Lei n. 8.989/1995", decidiu em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior.


De fato, a Lei n. 8.989/1995 dispõe sobre a isenção de IPI na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoa com deficiência.


Nesse sentido, o art. 6º da referida lei assim dispõe: "A alienação do veículo adquirido nos termos desta Lei que ocorrer no período de 2 (dois) anos, contado da data de sua aquisição, a pessoas que não satisfaçam as condições e os requisitos estabelecidos para a fruição da isenção acarretará o pagamento pelo alienante do tributo dispensado, atualizado na forma prevista na legislação tributária.".


No julgamento do REsp 1.310.565/PB, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que referida isenção tem finalidade extrafiscal e que a suspensão da cobrança do IPI cessa caso haja alienação do veículo antes de dois anos da aquisição que contempla o benefício. A previsão legal é no sentido de "[...] coibir a celebração de negócio jurídico que, em caráter comercial ou meramente civil, atraia escopo lucrativo".


Por outro lado, na mesma oportunidade, ressaltou-se que o cenário é diverso quando a transferência do veículo se dá para o fim de indenização pela seguradora, em caso de sinistro. Isso porque, "nesse contexto, ausente a intenção de utilizar a legislação tributária para fins de enriquecimento indevido [...]".


Assim, considerando que a norma legal acerca da perda do benefício da isenção do IPI, em caso de alienação antes do prazo definido, possui o intuito de "coibir a celebração de negócio jurídico que, em caráter comercial ou meramente civil, atraia escopo lucrativo", consoante assentado pela jurisprudência acima apontada, a transferência do veículo, em caso de sinistro, não se amolda à previsão legal que faz cessar o benefício, sobretudo porque não se verifica, nessa circunstância, alienação propriamente dita, com caráter de voluntariedade, nem qualquer "intenção de utilizar a legislação tributária para fins de enriquecimento indevido".


Ressalta-se, por fim, que a cobrança de tributo, sendo atividade administrativa plenamente vinculada, deve ocorrer nos limites do que a lei determina, em obediência ao princípio da legalidade. Ora, a Lei n. 8.989/1995 não possui previsão que autorize a cobrança do IPI dispensado no caso de transferência de veículo/sucata para a seguradora, situação que não se confunde com a alienação voluntária, estabelecida na norma em referência.


Desse modo, deve ser mantida a isenção de IPI quando da transferência do veículo/sucata para a seguradora como cumprimento de cláusula contratual para pagamento de indenização decorrente de sinistro, seja porque a situação não caracteriza alienação voluntária por parte do beneficiário da isenção, seja porque não há previsão legal para a cobrança do IPI outrora dispensado nesse caso.


Informações Adicionais


Legislação


Lei n. 8.989/1995, art. 6º


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Processo


Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 16/10/2025, DJEN 24/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO TRIBUTÁRIO


Tema


Imposto de Renda. Fundos de investimento. Transferência de titularidade por sucessão causa mortis. Avaliação pelo valor histórico declarado na última DIRPF. Não incidência tributária.


Destaque


A transmissão de bens e direitos por herança, quando avaliados pelo valor histórico constante da declaração de bens do de cujus, não se submete à incidência do Imposto de Renda, por não configurar acréscimo patrimonial apto a gerar o fato gerador previsto no art. 43 do CTN.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em saber se há incidência do Imposto de Renda sobre a transferência de titularidade de cotas de fundos de investimento por sucessão causa mortis, quando realizada pelo valor histórico constante da última declaração de bens do de cujus.


O fato gerador do Imposto de Renda ocorre de duas formas: a) existência de ganho de capital (pela valorização das cotas); ou b) acréscimo patrimonial (em razão dos rendimentos financeiros proporcionados pelo fundo de investimento). No caso em exame, não se verifica nenhuma das duas hipóteses citadas.


No contexto da sucessão causa mortis, o artigo 6º, inciso XVI, da Lei n. 7.713/1988, é claro ao estabelecer que "Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) XVI - o valor dos bens adquiridos por doação ou herança". O artigo 23 da Lei n. 9.532/1997, cuja constitucionalidade fora reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 1.425.609/GO, dispõe que, na transferência de direito de propriedade por sucessão, os bens e direitos poderão ser avaliados a valor de mercado ou pelo valor constante da declaração de bens do de cujus ou do doador (DIRPF).


O parágrafo 1º do mesmo artigo é explícito: "Se a transferência for efetuada a valor de mercado, a diferença a maior entre esse e o valor pelo qual constavam da declaração de bens do de cujus ou do doador sujeitar-se-á à incidência de imposto de renda à alíquota de quinze por cento." O § 4º complementa, afirmando que "Para efeito de apuração de ganho de capital relativo aos bens e direitos de que trata este artigo, será considerado como custo de aquisição o valor pelo qual houverem sido transferidos".


Interpretando a legislação, conclui-se, no caso de bens e direitos transmitidos por herança, a incidência do Imposto de Renda somente se verifica sobre o ganho de capital eventualmente apurado, ou seja, sobre a valorização do bem, quando este é transferido a valor de mercado e esse valor de mercado supera o valor constante da última declaração do falecido. Quando a transferência é realizada pelo valor histórico, como no caso em discussão, não há ganho de capital a ser tributado.


Saliente-se que, em regra, nos fundos de investimento, constituídos sob qualquer forma, a base de cálculo do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), devida por ocasião da liquidação, é composta pela diferença positiva entre o valor do resgate e o da aquisição das quotas, nos termos do art. 28, II, e § 7º, da Lei n. 9.532/1997.


O Tribunal de origem entendeu, com base no art. 65, caput, e parágrafos 1º e 2º, da Lei n. 8.981/1995, que, embora a sucessão causa mortis não implique o resgate de cotas nos fundos constituídos, a fim de ensejar a incidência do IRRF, a transferência de titularidade do fundo para os herdeiros autorizaria tal tributação, porquanto a alienação das quotas compreenderia qualquer forma de transmissão da propriedade.


Nada obstante, não há falar na aplicação de tais dispositivos ao presente caso. A norma em testilha versa sobre a incidência do IRRF sobre o rendimento produzido por aplicação financeira de renda fixa e não de investimento, como na hipótese. Ademais, a alienação, como ato de vontade tributável, não abrange as transferências causa mortis, disciplinada de modo específico no antes referido art. 23 da Lei n. 9.532/1997.


Dessarte, conforme precedente da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, "não há norma legal stricto sensu a determinar a incidência de IRRF sobre a mera transferência de quotas de fundos de investimento - de qualquer modalidade - decorrente de sucessão causa mortis, quando os herdeiros optam pela observância do valor constante da última declaração de bens de cujus. Somente incide o tributo se a transferência for realizada por valor de mercado e houver diferença positiva relativamente ao valor de aquisição" (REsp n. 1.968.695/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 13/8/2024, DJe de 29/8/2024).


Informações Adicionais


Legislação


Código Tributário Nacional (CTN), art. 43.


Lei n. 7.713/1988, art. 6º, XVI


Lei n. 9.532/1997, art. 23, parágrafos 1º e 4º, art. 28, II, e § 7º


Lei n. 8.981/1995, art. 65, caput, e parágrafos 1º e 2º